domingo, 14 de março de 2010

Mulheres

Estou perdido, não posso viver um dia sem te ver, te sentir, acariciar sua pele morena e doce. Você partiu de minha vida, sem compreender que o que fiz foi por amor, um amor viciante. Mas por você o que sinto é 'amor-supremo-amor-eterno-amor', desses que cegam, que nos matam quando distante. E é isso que acontece agora, você partiu e pouco a pouco vou morrendo.

Tudo começou quando nasci, eram tantas as mulheres à minha volta que não podia ser diferente, me apaixonei por todas. Não tinha pai, minha mãe, moderna para a época, tinha uma namorada. O pai que me gerou é um amigo que estava morrendo e não tinha filhos, queria deixar um no mundo e pediu que minha mãe o ajudasse. E assim fui feito num laboratório, dizem que sou um dos primeiros.

Paula é minha mãe e Ana, também. Mas Ana faz as vezes de pai, ela é a figura masculina da casa. Minha mãe é doce, como a fruta mais delicada das árvores de nosso quintal, e Ana é sagaz para os negócios e nos faz uma família. Briga com todos pelos nossos direitos, não aceita que nos descriminem. E com o tempo, conquistou respeito e confiança em toda a Cidade. Hoje ela é presidente da associação de comércio da Cidade, todos vão consultá-la para pedir conselhos sobre seus negócios. Querem que ela seja Prefeita da Cidade, mas ela não quer, diz que já basta toda a trabalheira que tem.
Minha mãe Paula, por sua vez, cuida da casa, da escola que mantém no bairro e das mulheres que chegam por ali pedindo apoio porque foram espancadas por seus homens. Cresci entre tantas mulheres lindas e fortes. Praticamente fui o único homem por ali, lembro de poucos funcionários, mas não duravam, a maioria ia embora porque não aceitavam a relação das minha mães, ou porque não podiam receber ordens de mulheres, ou simplesmente porque não tinham respeito e não sabiam tratar as pessoas.
Lembro bem quando Amélia chegou com sua filha Sabrina. Amélia veio porque não agüentava mais o marido que bebia todos os dias,  ele não tinha emprego e Amélia trabalhava pra sustentar a casa, a filha e o marido. Ela disse que ele se sentia diminuído por isso, e bebia, quando voltava se algo não lhe agradasse ele espancava a mulher. Mas chegou o seu limite e por isso ela saiu de casa. Trabalharia dia e noite para ter direito a cama e comida para ela e a filha, ajudaria com as outras mulheres e crianças, só queria ser aceita ali na Comunidade. Era assim que as mulheres falavam, diziam que viviamos numa Comunidade.
Sabrina tinha, 7 anos, apenas 3 anos mais nova do que eu. Uma menina morena, cabelos cacheados, que viviam presos num volumoso rabo-de-cavalo. Usava sempre uns vestidos floridos feitos por sua mãe, por isso eu a chamava de menina-flor. Crescemos juntos e junto foi crescendo o meu amor por ela. Mas eu não compreendia.
Com o passar dos anos, fui apresentado ao amor carnal que as mulheres podiam me proporcionar o que foi minha perdição. Não vivia mais sem mulheres. Queria sentir o cheiro de todas, tocar suas partes, recitar poemas com a cabeça encostada naqueles deliciosos corpos. Cheiros, sabores, textura, cada uma tinha um e eu queria descobrir o de todas. Aquele era o meu segredo com as mulheres, nunca prometi casamento, mas sempre disse que poderia ser o amante eterno de todas elas. Não havia ciúme, elas sabiam que eu não era uma posse, era um bem a ser compartilhado. Era o melhor amante e confidente.

Sabrina sempre esteve ao meu lado, quando ela tinha 17 anos, começamos a namorar. No dia que ela completou 18 anos, eu ganhei de presente sua pureza. E me embriaguei. Aquele era o melhor cheiro, o melhor sabor. Sua pele era macia, tinha o toque das pétalas das flores que minha mãe tinha em casa. Tudo aquilo me seduziu, eu não entendia o que estava acontecendo, algo havia mudado em mim. Não podia viver sem as outras mulheres, era um vicio, mas não podia viver sem a Sabrina. Um dia sem seus beijos me arrebentava, me entristecia.
Continuei com meu segredo, nas tardes de trabalho arrumava uma forma de escapar e visitar minhas amigas. Mas um dia Sabrina descobriu e quando soube jurou nunca mais me olhar nos olhos, nunca mais me amar. Tentei explicar, queria que ela entendesse que tudo aquilo era amor, excessivo amor por mulheres, mas que elas nada significavam pra mim. Ela não me deu chances, partiu, sem dizer nada, foi para a casa de uma tia na Cidade vizinha, foi com a desculpa de que ia estudar e procurar um emprego.
Agora estou aqui, sofrendo. Da forma mais dura descobri que o que sinto pela Sabrina é diferente, ela sim é o meu vício. Sem ela não sei viver,  não tenho porque respirar, não tenho porque me alimentar. Minhas amigas me procuram, revezam ao meu lado tentando me agradar, já fizeram as propostas mais assanhadas, e recusei todas. Eu quero a Sabrina de volta, estou morrendo, morrendo por excesso de amor pelas mulheres.
por Roseana Franco

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